A favela não é tudo isso

Carioca quando quer consegue ser uma raça infeliz, e não só o carioca, mas o brasileiro em geral, de todos os estados. Essa infelicidade não é exclusiva do sudeste, assola também o centro oeste, o norte e o nordeste. Nos grandes centros a coisa acaba sendo mais sentida, pois a visibilidade é maior e a mídia, que dita os padrões, faz questão de reforçar as “tendências” absurdas que são criadas a cada estação.

Aqui no Rio a “tendência” do momento é que se você não conhece ou morou em uma favela, você não tem propriedade para falar sobre qualquer coisa relacionada e você não sabe o que é dificuldade. Você é discriminado por isso, porque é legal “conhecer” de perto uma favela e seus habitantes. As pessoas enchem a boca para dizer que foram no morro tal ou subiram a favela XYZ e ainda fazem questão de frisar que foi quando ela ainda não era “pacificada”, porque agora, é fácil. Elas dizem isso como se fosse algo de outro mundo, como se subir em uma favela fosse a experiência máxima que todo ser humano deveria ter.

As pessoas que moram em comunidade, são iguais a todas as outras. O milionário que mora na mansão, o trabalhador classe média que conseguiu comprar o seu espaço e todos que não moram em favelas tem os mesmos direitos e não podem ser taxados disso ou daquilo. Condição social ou moradia, não é moda e nem indicador de nada, cada um vive onde quer e pode.

Essa idolatria para com a favela e seus habitantes precisa diminuir, o produto do morro é fantástico, mas também temos pessoas fantásticas nos apartamentos, nos bairros, em conjuntos habitacionais e em vários outros lugares. Não é demérito nenhum ter vindo de uma favela ou morar em uma, mas isso também não torna ninguém especial ou intocável.

A forma

A forma existe da definição. Uma forma indefinida, sem contornos, é uma forma que não causa impacto, não chama a atenção. Não que seja esse o proposito fim, não que seja esse o objetivo da existência da forma, mas ela não é só admirada pelo que pode ser.

O belo é subjetivo, a forma é real. Existe e deve aparecer, sem a necessidade de adornos, ela só precisa de seus contornos, suas curvas, suas reentrâncias. O reto, polido, é discreto.

Curvas deslizam suave. Retas, paralelas ou não, seguem o fluxo e nada mais. Quem aprecia a forma a segue pelo caminho e não está preocupado com o fim, pois o durante é o mais importante.

Tal e qual o livro

Ela não quis ouvir o crepitar das folhas ao entardecer e nem se levantou para olhar o sol se por, ela apenas curvou-se para o lado e alcançou os óculos na escrivaninha para terminar de ler o ultimo capitulo do livro enfadonho que ganhou de aniversario. O livro falava de um passado não tão distante onde os personagens se encontravam para um ultimo baile. Depois do baile cada qual seguia sua rotina e convivia com as lembranças dos amores perdidos, sonhos desfeitos e promessas não cumpridas.

Amores perdidos, ela se deteve com atenção a este capitulo em especial. As muitas lembranças de seus muitos amores vieram-lhe a tona e ela pensou em cada um deles de uma forma especial, procurando entender o que poderia ter funcionado. Não havia uma resposta, isso era até obvio demais, pois não há realmente uma resposta ao passado. Não se pode prever o que teria acontecido se ela tivesse sido menos egoísta ou menos dramática. Ela deveria aprender com seus erros, buscando não mais errar em seus próximos relacionamentos, mas ela mesmo assim gostaria de poder conversar com cada um de seus antigos amores e questiona-los do porque tudo teve um fim.

Sonhos desfeitos foi uma das passagens do livro que menos a prendeu, pois ela não sonhava mais com nada, apenas queria que a vida fosse breve o bastante em suas resoluções para que os caminhos descortinassem-se a sua frente. Ela apenas seguia fluxo das coisas, não fazia planos ou pensava em chegar a um lugar especifico. Fosse um livro, ela teria apenas uma pagina e nela estaria escrito fim.

Sobraram as promessas não cumpridas em que ela acreditou. Promessas de amor, cumplicidade e até mesmo de uma vida feliz, vida esta que ela nunca viveu.

O escolhido foi

- Querida, você quer ver o filme da Julia Roberts ou o do Tom Cruise?
- Não sei?
- Como não sei? Escolhe um dos dois?
- Depende muito do meu estado de espirito no momento.
- Como? Ok, como está o seu estado de espirito no momento?
- Está normal, por quê?
- Porque você disse que depende dele para escolher o filme que vamos assistir.
- Escolhe um você e pronto! Só não quero ver filme chato e nem comédia, prefiro um filme que me faça pensar.
- O do Tom Cruise é uma comédia romântica e o da Julia Roberts é um filme de ação.
- Não deveria ser ao contrário?
- Por quê?
- A Julia Roberts é quem faz filmes românticos e o Tom Cruise é quem faz filmes de ação.
- Mas eles não podem mudar?
- Amor, pelo visto você não entende nada de filme, melhor eu escolher.
- Mas foi isso que eu pedi que você fizesse desde o inicio.
- Então quais são as opções?
- As que eu já lhe disse antes: Julia Roberts ou Tom Cruise
- Então vamos ver alguma coisa leve, escolhe o menos complicado.
- Menos complicado? Eu ainda não assisti nenhum dos dois para saber qual é o menos complicado, como vou escolher.
- Então faz o seguinte, vamos ver o Faustão mesmo e não se fala mais nisso. Bem que minha mãe avisou para não casar com um homem sem criatividade, mas não quis ouvi-la.

Pedaços de papel 2

Mostrei os pedaços do papel rasgado a tantas pessoas nesse mundo, que nem sei mais o que poderia acontecer de errado com o documento. Registrei em cartório minhas alegações, modifiquei meus votos e conclui que não há mais nada a ser feito, pelo menos não enquanto eu ainda for um rebelde sem causa ou um desafortunado.

Não tive muita sorte nesta vida, nem para escolher a roupa certa para cada ocasião. Casei-me de branco, fui batizado de vermelho e encarei minha primeira reunião importante de bermudas e chinelo de dedo. Fui demitido tantas vezes quantas foram necessárias, nunca fiquei tranquilo recebendo ordens de pessoas com menos capacidade, seja técnica ou intelectual, do que eu. Mandei muitos chefes à merda e outros tanto para outros lugares que vocês já devem saber quais.

No dia em que sai da concessionaria com meu carro novo, o primeiro dos três que tive, bati em um poste logo na primeira curva e tive minha primeira perda significativa, nem seguro eu tinha. Dois meses depois comprei outro carro e com ele fiquei por cinco anos até decidir que precisava de mais espaço. Comprei um SUV bem grande e permaneço com ele até hoje, mesmo que encostado na garagem.

Namorei a Lucia por tantos anos que quando rompemos tive que contratar um caminhão para levar as coisas dela. Como ela conseguiu deixar tantas coisas no meu espaço minúsculo isso eu não sei, mas quando o caminhão retirou todos os itens senti que poderia esticar as pernas quando sentasse no sofá.

E foi assim, de tanto esticar as pernas, que acabei casando com uma moça de longas pernas. Vivemos bem por uns anos, melhor por outros tantos, mas um dia não deu mais e cada um seguiu seu caminho. Melhor assim para mim, para ela e para todos aqueles que sempre foram a favor da felicidade que eu tento alcançar.

Hoje recolho os pedaços de papel rasgado e tento apenas continuar aquilo que comecei.

Vênus de Milo

As mulheres não nascem em pedestais, mas algumas são postas em um assim que são descobertas por um desavisado apaixonado, desses que deixa de enxergar todo o mundo a sua volta e só tem olhos para o seu objeto de consumo, a sua Vênus de Milo.

Elas não pedem por isso e até chegam a se espantar com tanta idolatria e devoção, mas não dá para colocar na cabeça daquele pobre homem que ela é um ser humano como outro qualquer, apenas uma mulher de carne e osso e não uma deusa mitológica. Ele não consegue parar de exaltar as tantas qualidades que ela tem, seus inúmeros dotes e sua beleza sem igual.

O amor cria toda a aura adoração daquele homem por aquela mulher e é por isso que no começo dos romances vemos com mais freqüência as declarações, os depoimentos e as comparações. O universo perde em magnitude, as maravilhas da natureza perdem em encanto, nada a supera em beleza e tudo a seu lado torna-se insignificante.

O perigo disso tudo é que se cria um ser inatingível, que com o tempo passa a ser quase que intocável e apenas objeto de admiração e não um ser real, uma mulher com defeitos e qualidades. O homem perde a noção e passa a viver em torno de uma criação de sua mente supostamente apaixonada e a mulher, se não tiver discernimento, passa a se portar e a exigir tudo o que ela pensa merecer por aquilo que ele diz que ela é.

As expectativas são elevadas a níveis estratosféricos, a relação não suporta e um dos dois percebe que toda a magnitude, encanto e beleza, não resistem a realidade.

Meiotagem S.A

Uma das piores coisas desse mundo são os seres humanos meiota, aqueles que seguem a meiotagem S.A. Os meioteiros são aqueles que ficam em cima do muro para tudo, não se decidem e ainda por cima acham que estão com a razão, desandando de reclamar de tudo e de todos. Para eles tudo tem uma desculpa, um motivo para não acontecer, mas nunca eles são os culpados.

Os meioteiros gostam de dizer que são independentes, que são ativos e que fazem o que der na telha, mas na realidade sempre precisam de alguém ou da aprovação de alguém para fazerem as coisas. Dificilmente você verá uma pessoa meiota tomar uma decisão importante sem alguém por perto ou sem fazer uma consulta previa ao máximo de pessoas que puder.

Eles não assumem um compromisso, estão sempre na fase do conhecimento, do ficar, e nunca evoluem disso para algo que o valha. Quando você encontra um meiota compromissado, ele sempre mantém certa distancia do seu par e você talvez conheça o “sortudo” se der sorte. A frase do meioteiro quando se trata de relacionamento é: “Eu gosto, mas não amo” ou “Estamos saindo, apenas isso”.

O meiota, seja homem ou mulher, procura pelo príncipe encantado, pelo castelo dourado e pela carruagem. Qualquer coisa menor do que isso o coloca em duvida, sem saber se deve ou não investir em algo que foge aos padrões que ele convencionou.

Você reconhece um meiota com facilidade porque ele sempre é o primeiro a vomitar regras e criticar aqueles que não as seguem, mas não fala nada sobre o fato dele mesmo não seguir as tais regras. Ele quer tudo do jeito dele e você não pode discordar porque senão ele simplesmente te exclui da lista de amigos. Para o meiota, quanto mais submisso você for melhor, mas você não pode ser meiota.

Sempre que puder afaste-se de pessoas assim, fuja dos meioteiros ou mantenha-os a uma distancia segura. Isso vai lhe poupar de lamentações, histórias tristes e muita indecisão.

Show da virada

Não entendo porque as pessoas sempre esperam que a sua virada, a passagem de um ano para o outro, seja o evento. Elas acham que tem que ter bateria de escola de samba, queima de fogos, ceia com mais de não sei quantos pratos e muita animação (Por animação leia-se um monte de bêbados com a barriga de fora, muita gritaria e tumulto). Aí quando você fala que a sua virada foi normal, que não teve nada demais, elas se decepcionam.

Eu detesto essa coisa de fogos, show pirotécnico dos infernos. Não tem nada tão desnecessário do que isso. É até bonito aquele monte de cores no céu, os desenhos e afins, mas é extremamente irritante aquele bando de idiotas soltando morteiros e outras “bombas” que só servem para fazer barulho.

O dia 31 de dezembro deveria ser um dia como outro qualquer, mas não, todos querem que esse dia seja quase que um marco de algo que não existe. Aí começam as superstições, as previsões e povo se enchendo de lentilha e uva verde. Não tenho nada contra a celebração, mas acho que não precisamos transformar as coisas em algo que todos são obrigados a fazer.

Gosto tanto de paz que acho que a melhor coisa a se fazer nessa época é ir para um lugar bem distante, longe de tudo e de todos, onde se possa ficar em silencio contemplando as estrelas e só. Nada de praias imundas com um monte de bêbados suados, nada de histeria coletiva, nada de banhos de espumante e muito menos de ser obrigado a ficar ouvindo música no último volume.

Que a paz que eu tenho ou a que eu procuro ter, nos outros trezentos e poucos dias do ano, materialize-se também no último dia do ano.

Resoluções para o próximo ano

Sim, hoje é o dia mais indicado para que você faça as resoluções para o próximo ano, mesmo que o ano atual tenha acabado de começar. O começo de um novo ano tem mais importância pela festa da passagem e as celebrações do que pelo próprio ano em si, pois já no primeiro dia as pessoas ignoram tudo o que foi dito, pensado, planejado nos outros trezentos e sessenta e cinco dias anteriores e voltam as suas vidinhas normais.

Pensando em um momento para escrever as metas para o próximo ano, não vejo melhor momento do que agora. Pegue um caderno, uma caneta e comece a fazer a sua lista antes que o ano termine e você não consiga escrever todos os seus planos. Não se esqueça de mencionar aquelas metas que você não vai cumprir, aquelas em que você vai precisar de ajuda e aquelas que você vai pelo menos tentar cumprir. De todas as resoluções feitas, é sabido que menos de dez por cento delas são realmente realizadas. O restante se acumula para o ano seguinte ou para sempre, pois nunca serão realizadas.

Lembre-se que o ano tem uma série de datas festivas que reduzem a quantidade de dias que podem ser utilizados, portanto realoque suas resoluções para que elas não deixem de ser realizadas por falta de tempo. No mais, você precisa ter vontade e coragem para fazer tudo acontecer, sem dar as mesmas desculpas e depois ficar se lamentando porque perdeu mais um ano.

Fazer alguém feliz

Atribuição inglória, pois fazer uma pessoa feliz não depende única e exclusivamente da nossa vontade, do nosso desejo e sim da pessoa em questão, pois quando ela não quer ser feliz, nada do que se faça vai adiantar. O conceito de felicidade é tão relativo e imensurável, que não dá para se dizer que podemos fazer alguém feliz, mas podemos tentar e o primeiro passo é sermos felizes.

A felicidade é refletida como um espelho e quando estamos felizes, essa felicidade reflete no outro e pode contagia-lo, faze-lo crer que é possível mesmo diante de adversidades. Não importa se você é feliz com um pedaço de papel em branco onde põe suas ideias ou transforma em um barquinho ou se você é feliz com uma taça de vinho, o que importa é que essa felicidade seja sentida em sua plenitude.

Para fazer alguém feliz não é necessário se transformar em algo do outro mundo ou mover céus e terras para isso. Quanto mais simples, mais fácil e pratico, melhor. O essencial não é o que salta aos olhos e sim o que faz bom ao coração e conforta a alma.