Religiosamente todos os dias, com ou sem novela, com ou sem futebol, eu me deito às nove. Pode estar chovendo ou com uma belíssima lua, eu me deito às nove. Estando ela comigo ou não, sendo segunda ou feriado, inteiro ou quebrado, eu me deito às nove.
A rotina não me consome, não dói e muito menos vai acabar com os meus dias, eu durmo as nove porque é justamente nesta hora que meus piores pesadelos se manifestam enquanto estou desperto. Quando, as nove, deito a cabeça, removo da mente todas as aflições de uma vida em desalinho e as substituo pelas loucas ideias de uma vida sem limites físicos e psicológicos. Uma vida de acordo com o que acredito ser real.
O que pouco a pouco mina minhas forças e resistências é assistir incólume a degradação do meu eu interior, a venda indiscriminada de minhas ideias e sonhos mais absurdos, é impassivelmente constatar que não sou nada diante do todo reinante. O que deveria ser não é e nunca foi, o que sou ou imaginava que fosse, não existe mais.
Hoje revirando as gavetas encontrei os rascunhos do projeto final de alguém e esse alguém, hoje dorme as nove sem nenhuma condição de concluir aquilo que nunca começou. Eu durmo as nove porque é mais fácil não ter que olhar nos olhos de quem me encara a espera de uma resposta, sem ter o que dizer. É melhor fugir do que enfrentar, melhor se esconder do que confrontar o fato que não sei como e nem o que fazer.